
Todo dia Benú desenhava um peixe no barro mole do quintal de casa.
Usava uma faca de mesa. Sua mãe dizia para não brincar com as facas e ele todo dia desobedecia. Uma parte da madeira da faca estava rachada. Ela dizia que mesmo velha, a faca era importante para ela. No dia seguinte, lá estava Benú no quintal. Desenhava o peixe e jogava a faca no barro para acertar o olho do peixe. Errava e errava. A mãe reclamava e tomava de volta a faca.
No dia seguinte, Benú acertou o olho do peixe. A faca ficou enterrada. Tentou puxar, não conseguiu. Cavou, cavou. E a faca descia cada vez mais. Benú se jogou no barro e tocou em um pedaço de madeira. Era um tronco velho de uma árvore. Uma madeira meio podre, meio fraca.
Benú entrou no tronco. Do outro lado, viu uma menina brincando. Ele atravessou o túnel do tronco e ficou impressionado com o quintal da menina. Era maior que o dele, era mais verde. O ar era mais limpo. Havia um riacho perto. Benú notou que ela segurava uma faca com um pedacinho de madeira rachada. Ele notou o peixe desenhado no barro. Ela tinha um rostinho familiar. Benú avisou que era do futuro, que a menina era sua mãe e que com aquela faca ele iria brincar anos depois. Ela riu.
Continuou jogando a faca no barro tentando acertar o olho do peixe. Seu pai chegou, perguntou quem Benú era e ele respondeu que era seu neto. O homem se espantou. Benú apontou para o buraco no chão e disse que veio do tronco. Acrescentou que era do futuro. O homem o chamou de maluco e ficou ali perto observando os dois brincarem. Benú tentou acertar o olho do peixe. Arremessou a faca com força. Acordou deitado no barro. Seu rosto doía. Sua mãe gritava seu nome.

Image: "Benú", by Vera Bulla (2023)
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